A indústria brasileira ficou mais competitiva em 2018 porque caiu o custo com o trabalho. Pela primeira vez desde 2009, no entanto, essa redução se deu porque os salários dos trabalhadores estão menores – e não porque a produtividade aumentou. Estudo da Confederação Nacional da Indústria (CNI), obtido pelo ‘Estadão/Broadcast’, mostra que, no ano passado, o Custo Unitário do Trabalho (CUT) caiu 16,1%. Esse indicador representa o quanto a empresa gasta com mão de obra para produzir um item, como uma caneta ou um televisor, e é um dos principais determinantes da competitividade de um país.
A queda é uma boa notícia para a indústria, já que indica que está mais barato produzir. Para o trabalhador, no entanto, a notícia é ruim, já que a redução se deve à queda da remuneração (-6,6%), reflexo da crise e do desemprego em alta. Depois de subir nos últimos anos, a produtividade ficou praticamente estagnada e avançou apenas 0,8% em 2018.
“Tudo o que as empresas podiam fazer para aumentar a eficiência com baixos custos, como mudança de gestão, redução de desperdícios, melhorias de qualidade, eles já fizeram. Agora, para aumentar a produtividade, precisamos investir em máquinas, em equipamentos. Mas estamos em um cenário difícil porque estamos em uma situação de confiança se recuperando”, disse a economista da CNI Samantha Cunha, responsável pelo estudo.
A alta do dólar no ano passado também influenciou – descontado o efeito da variação da taxa de câmbio real (10,5%), a redução do custo do trabalho foi de 7,5%. Sem considerar a variação cambial, o custo do trabalho havia caído nos últimos dois anos. Nas duas ocasiões, no entanto, essa queda se deveu ao aumento da produção, já que os salários ainda estavam em alta.
“O aumento da produtividade é importante para que os salários cresçam sem pressionar os custos das empresas. Com a economia crescendo de forma sustentável, a produtividade cresce, isso é repassado aos salários e o padrão de vida se eleva”, explicou Samantha.
Efeito do câmbio
Ao longo da última década, o Custo Unitário do Trabalho caiu 9,4%, mas isso se deveu à variação da taxa de câmbio real (35,9%). Retirado o efeito do dólar, o custo subiu 23,1% entre 2008 e 2018, com aumento nos salários de 37,5% e alta de apenas 11,7% na produtividade.
“Trata-se de um quadro crônico. O gráfico da produtividade é uma reta horizontal. É um eletrocardiograma de um morto”, afirma o economista do trabalho e professor da Universidade de São Paulo (USP), José Pastore. Segundo o especialista, entre as causas para a baixa produtividade brasileira – equivalente a um quarto da produtividade americana – estão a má qualidade da educação básica, a tecnologia atrasada na maior parte das empresas e o amadorismo de grande parcela dos administradores do País.
“É claro que tem muita coisa boa, muitas companhias brasileiras na vanguarda mundial. Mas são minoria, e estão concentradas em alguns nichos. Na maior parte do País ainda predomina a informalidade, com pouco capital humano, pouco capital físico e uma grande precarização do trabalho”, completa.
Em relação ao custo médio dos principais parceiros comerciais brasileiros, o indicador do Brasil caiu 9,5%. O gasto do Brasil só não caiu mais do que o da Argentina, onde o indicador recuou 27,1% em meio à crise que fez o dólar disparar no país.
Falta crédito
Empresário do setor de vestuário, o presidente da Associação Brasileira do Vestuário (Abravest) e do Instituto Brasileiro do Vestuário (IBV), Roberto Chadad, atribui a estagnação da produtividade no setor à falta de crédito para investimentos na renovação do parque de produção.
“Em termos de tecnologia, estamos 10 anos atrasados em relação à Europa e 20 anos atrasados na comparação com a China, que robotizou boa parte das fábricas. Com instrumentos de corte e costura a laser, hoje um trabalhador chinês consegue fazer sozinho uma camisa em poucos minutos, sem a necessidade de diversas etapas de produção”, relata.
Segundo o executivo, a baixa produtividade da indústria é acumulada em toda a cadeia até o produto final. “Não falta criatividade, não falta desenvolvimento de produto. Temos diversos cursos universitários de moda, formamos mil profissionais por ano. Mas o setor não acompanha. Botões, fios e outros insumos também não chegam à qualidade de que precisaríamos”, acrescenta.
Por isso, as maiores companhias do vestuário acabaram mudando suas fábricas para a Ásia, enquanto as pequenas e médias confecções – que representam 97% das empresas do setor – estagnaram em produtividade.
De acordo com Chadad, na década de 1980, o setor contava com 1,75 milhão costureiros e costureiras. Hoje, mal passa de 700 mil. “E não há perspectiva de contratar mais enquanto houver esse peso de impostos na folha de salários.”
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.