Em bom momento, agricultura espera bater novos recordes de safra em 2020

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Hoje, com 53 anos de idade, o produtor rural José Guilherme Brenner lembra com nostalgia do tempo em que escutava constantemente a frase de que, um dia, o Brasil se tornaria o celeiro do mundo. Na época da infância, principalmente durante a década de 1970, o país dava os primeiros passos para se tornar uma potência do agronegócio, especialmente ao começar a dominar as tecnologias de agricultura tropical. Até então, era comum que apenas as nações localizadas fora das linhas dos trópicos de Câncer e de Capricórnio registrassem bons índices de produtividade — por estarem em uma zona temperada, esses locais contavam com condições climáticas e de solo mais adequadas para o cultivo. Mas, a partir dali, a história começou a mudar.

“A agricultura brasileira teve uma evolução fantástica, principalmente nas técnicas de plantio, nos materiais e nas variedades de culturas. Durante esse tempo, apesar de todos os obstáculos que foram surgindo, a agricultura do Brasil sempre conseguiu se renovar e dar a volta por cima”, diz José Guilherme. “Embora hoje tenhamos custos maiores, acredito que temos um pouco mais de segurança em termos de produtividade, o que possibilitou o país atrair mais investimentos e aprimorar os equipamentos”, acrescenta.

O ganho em eficiência produtiva fez com que o país começasse a crescer de forma verticalizada no agronegócio, até porque a importação do pacote tecnológico se refletiu na expansão dos pontos do mapa brasileiro que se tornaram propícios para o cultivo. Se antes os estados do Sul eram os que mais contavam com produtores rurais, em razão da similaridade climática com os países temperados, os agricultores têm agora um vasto território a ser explorado, como fez o pai de José Guilherme, ao deixar uma fazenda no interior do Paraná para apostar no solo do cerrado candango.

“Desde que chegamos ao Distrito Federal, o nosso forte passou a ser o cultivo de grãos, principalmente, soja, milho e feijão. Aos poucos, fomos evoluindo. No início, por exemplo, colhíamos em torno de 40 sacas de soja por hectare. Hoje, já consigo, pelo menos, 70. Isso foi possível porque o DF tem uma área de produção mais concentrada, o que facilita o emprego de tecnologias, e conta com conjunturas climáticas e topográficas mais adequadas, além de uma boa estrutura de solo e boas distribuições de chuva”, analisa o agricultor.

Graças aos avanços tecnológicos e ao clima, José Guilherme, assim como muitos produtores rurais no território nacional, consegue plantar e colher duas safras no período de um ano — o que coloca o Brasil à frente de nações europeias e dos Estados Unidos em determinadas produções, visto que a maioria desses países tem apenas uma safra. Entre outubro e novembro, é plantada a primeira safra, geralmente de soja ou feijão. Após a colheita, em fevereiro ou março, o solo é preparado para a popular “safrinha”, quando são cultivadas as sementes de milho, que serão colhidas em junho ou julho.

O produtor destaca a evolução do sistema de plantio, passando do convencional para o direto, mais conservacionista e que previne erosão, um dos motivos do salto na produtividade. “O grande diferencial é que, logo após colher uma lavoura, plantamos a outra safra já em cima daquela palha. Não precisamos mais revolver o solo. Isso deu um ganho muito grande para a agricultura”, explica.

Diferencial

São exemplos como o de José Guilherme que fazem a agricultura brasileira competir de igual para igual com a de qualquer outro local do mundo. “Hoje, com a agricultura digital, de bastante precisão, já sabemos exatamente quais são as áreas que precisamos melhorar. Também houve uma evolução genética importante. Assim, economizamos insumos e ganhamos em eficiência produtiva”, ressalta o superintendente técnico da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Bruno Lucchi. Segundo ele, a conectividade implementada no campo, como o uso de sensores de monitoramento de solo, para controlar a umidade, e o supervisionamento via drones, para visualizar a infestação de pragas, “melhoram o trato cultural e as boas práticas de produção”. “O resultado é uma produção mais sustentável, com viabilidade técnica, econômica e ambiental. Esse é um conjunto de fatores que mostra porque o Brasil é cada vez mais é referência”, frisa.

Na safra 2018/2019, em geral, os cultivos agrícolas tiveram bom desenvolvimento diante da ausência de alterações drásticas nas condições meteorológicas. O ano passado foi “satisfatório”, segundo Lucchi, destacando que o país se tornou o maior exportador de milho do mundo, com o embarque de 44,9 milhões de toneladas. “A agricultura sempre foi o carro-chefe do crescimento do agronegócio, sendo responsável por 70% do valor bruto da produção. Além disso, hoje, representamos em torno de 22% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro.”

Para a safra 2019/2020, a expectativa é de que a produção de grãos registre recordes em diversos setores. A estimativa da CNA é de uma produção de 248 milhões de toneladas, com aumento de 2,5% sobre o ano anterior. “Acreditamos que será possível melhorar bastante os índices de produção e produtividade, tanto para atender o mercado doméstico quanto para seguir firme nas exportações”, prevê Lucchi.

Adolfo Dalla Pria, professor do Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade de Brasília (UnB), explica que o Brasil se tornou um dos maiores exportadores de commodities agrícolas do mundo, principalmente em soja e carne. O setor, avalia o professor, além de ser uma das principais bases da economia, também exerce papel importante na geração de empregos. “A quantidade de produtos que temos para exportação é significativa. Superamos países que há 10 anos eram maiores exportadores de commodities. O agronegócio gera muito emprego, tanto básico quanto de nível alto, porque estamos cada vez mais tecnificando a agricultura”, frisa.

De acordo com o especialista, o Brasil é um país privilegiado para o desenvolvimento agrícola. “Temos espaço para aumentar ainda mais essa produção, principalmente, nas áreas de pastagem. Se conseguirmos incorporar tecnologia de ponta, o Brasil vai se tornar o grande celeiro do mundo, dobrando a produção”, aposta. No entanto, Pria ressalta que um dos desafios é diminuir a diferença social no campo, caracterizada por uma realidade de extremos. “Temos regiões no Brasil que produzem commodities com alta tecnologia e, ao mesmo tempo, produtores que operam com tecnologias básicas, utilizando o trabalho manual, com foice e enxada”, lamenta.

Especialização é a chave

Em Brasília, algumas entidades buscam auxiliar os produtores mais humildes a expandirem o próprio negócio por meio de cursos de especialização. É o que faz a Federação da Agricultura e Pecuária do Distrito Federal (Fape-DF), por meio de programas como o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar) e a Assistência Técnica e Gerencial (Ateg).

“Chegamos ao produtor e, de forma gratuita, damos toda a assistência necessária para o segmento dele por um período de dois anos. A agricultura exige cada vez mais conhecimento e profissionalismo. Por isso, é importante para o produtor se qualificar”, garante o presidente da Fape-DF, Fernando Cezar Ribeiro, 58 anos.

Dono de três grandes fazendas no DF e em Goiás, Fernando Cezar sabe bem da importância de uma especialização. A sua produção, que começou como forma de entretenimento em 1985, hoje é a principal fonte de renda da família dele. Além do cultivo de grãos, o agricultor conta com produções de ovos férteis e de frangos de corte. Por ano, a primeira tem capacidade para render aproximadamente 16 milhões de ovos, enquanto a segunda, 1,8 milhão de aves.

Visando seguir os passos do pai, Fernando Cezar Ribeiro Junior, 19, já planeja começar algum curso disponibilizado pela Fape-DF. “São 35 anos de história que meu pai construiu e que não podem ser jogados fora. E como tudo atualmente requer dedicação e conhecimento, quero estudar desde cedo para que, no futuro, eu possa tocar o negócio. Não será fácil, mas pelo menos tenho um bom mestre para me ensinar”, afirma.

Com informações do Correio Braziliense

Na foto: José Guilherme Brenner, no meio de sua plantação de feijão. Tecnologia tem sido aliada para ampliar a colheita (foto: Carlos Vieira/CB/D.A Press)

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