Reabertura do comércio em Brasília se torna briga na Justiça mais uma vez

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Mais uma vez a Justiça interfere nos planos do Governo do Distrito Federal (GDF) sobre a reabertura de atividades não essenciais. No último sábado, a juíza federal Katia Balbino Ferreira, titular da 3ª Vara Cível, proibiu o Executivo local de flexibilizar as medidas de distanciamento social por causa da covid-19. A magistrada acatou, em parte, a um pedido conjunto do Ministério Público Federal (MPF), do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) e do Ministério Público do Trabalho (MPT) que questiona o plano de reabertura em um momento em que os números de casos de infecções pelo novo coronavírus aumentam expressivamente. Ao Correio, o governador Ibaneis Rocha (MDB) informou que recorrerá da decisão.

Na sentença, a magistrada deu um o prazo de dez dias para que o governo apresente os dados sobre a evolução da doença na capital, além do número de leitos destinados a pacientes diagnosticados com o novo coronavírus. O GDF, também, terá que apresentar um gráfico com projeções do avanço da pandemia com base no isolamento social de 60%, 40% e 35%. A determinação pede, ainda, planejamento com critérios técnico-científicos, que embasam as medidas de abertura de novas atividades não essenciais no Distrito Federal.

Informações sobre os estoques de equipamentos hospitalares, bem como as ações que serão implementadas para evitar aglomerações em estações de metrô, terminais e pontos de ônibus ou dentro dos veículos de transporte coletivo, também, terão que ser apresentadas à Justiça. Todas essas medidas visam garantir a segurança da população do DF diante da pandemia, que já tirou a vida de 386 brasilienses nos últimos três meses. De acordo com o boletim epidemiológico mais recente divulgado, ontem, pela Secretaria de Saúde, a capital contabiliza 33.227 casos da covid-19.

Para o MPF, o MPDFT e o MPT, o aumento no número de infectados está relacionado com a flexibilização do isolamento, como a liberação do funcionamento de shoppings, centros comerciais e feiras. Com a reabertura de diversos setores, observou-se que a taxa de distanciamento social no Distrito Federal diminuiu, passando de 62,5% em abril para 35,6% na última sexta-feira — o ideial, segundo pesquisadores é que a taxa seja de 70%. Além da preocupação com a ocupação dos leitos de UTI na rede pública, que chegou a 65,6% ontem.

O epidemiologista e professor da Universidade de Brasília (UnB) Jonas Brant afirma que o momento não é para a flexibilização das atividades. “Estão querendo adotar medidas que, em outros países, só foram implementadas quando a taxa do número de casos estava estabilizada. Não é o que ocorre aqui, estamos em um período crescente de infectados”, alerta. Segundo Brant, com os setores que já foram autorizados a funcionar, a tendência é de que o sistema de saúde fique sobrecarregado durante o período de pico da doença — prevista para os meses de julho e agosto.

Ele afirma que a sobrecarga não está atrelada, apenas, ao número de ocupação de leitos, mas, também, à quantidade de profissionais infectados com o vírus e que precisarão ficar afastados, em isolamento. Para o epidemiologista, é preciso fazer um rastreamento adequado da infecção, além do isolamento social e de políticas públicas sociais e econômicas para a população com menor poder aquisitivo. “Uma das questões graves que encontramos no DF é a quantidade de casos registrados pela Secretaria de Saúde de pessoas confirmadas que não têm a região informada. Isso significa que o número de contaminados nas cidades pode ser bem acima do registrado”, pontua.

De acordo com Brant, o que está acontecendo em Ceilândia — quantidade alta de infectados e de óbitos pela covid-19 — é um reflexo do Distrito Federal. “Não adianta fechar os setores apenas em uma região. É preciso tomar medidas drásticas, agora, para que não tenhamos um quadro ainda pior, em que todos os moradores terão, ao menos, uma morte na família”, argumenta o epidemiologista.

Críticas

Com a expectativa de retomada das atividades nos próximos dias, representantes de diversos setores, como bares, restaurantes, academias e salões de beleza criticaram a decisão da Justiça e analisam a possibilidade de entrar com recurso junto com o governador Ibaneis Rocha (MDB) para derrubar a medida judicial.

Ao Correio, o presidente do Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares de Brasília (Sindhobar-DF), Jael Antônio da Silva, afirma que está sendo criado um governo paralelo. “Estão tirando o direito do governador de governar. Quem tem que decidir é o governo, ele que está acompanhando”, ressalta. Para ele, cada dia a mais de portas fechadas faz com que os empreendimentos fiquem sem opções. “Por outro lado, as pessoas estão se aglomerando em feiras, no transporte público. O comércio informal só cresce”, avalia Jael. Se a situação permanecer assim, ele estima que mais de 30 mil pessoas estarão desempregadas, apenas no setor, até o fim do mês.

O Sindicato das Academias (Sindac-DF) encara a ação como absurda. “Nosso setor está ligado, diretamente, com a saúde das pessoas, no cuidado com as comorbidades. Não tem sentido o que está acontecendo”, relata a presidente da entidade, Thaís Yelene. Ela ressalta, ainda, que o setor é de extrema importância para melhorar a imunidade, principalmente, em um momento de pandemia. “Não sou eu que estou dizendo, a Organização Mundial da Saúde (OMS) afirma que a atividade física é essencial para o sistema imunológico”, rebate.

Para o presidente do Sindicato dos Salões, Institutos e Centros de Beleza, Estética e Profissionais Autônomos do Distrito Federal (Simbeleza-DF), Célio Paiva, a decisão da Justiça é péssima para o setor, que estava se preparando para a retomada das atividades em 1º julho. “Estávamos na expectativa para a reabertura, agora, não sabemos como vai ser. Estamos avaliando com os empresários para definir as estratégias”, adianta.

O presidente da Associação Comercial do DF (ACDF), Fernando Brites, acredita que a decisão judicial é exagerada. “Tivemos o ebola e outros vírus piores e que não precisou disso tudo. Essa decisão causa mais pânico na população. As pessoas devem se cuidar, sim, mas, também, precisam ter o livre arbítrio”, critica. Na noite de ontem, entidades do setor produtivo manifestaram-se por meio de nota pública contra a decisão da juíza.

16 mortos, entre eles, uma criança

Nas últimas 24 horas o Distrito Federal registrou 989 novos pacientes com a covid-19 e 16 mortes em decorrência da doença. Entre as vítimas está uma criança, que não teve a idade divulgada. O número de óbitos acumulado na capital atingiu, ontem, a marca de 386 ocorrências. Até a última atualização, feita pela Secretaria de Saúde do Distrito Federal (SES-DF), havia 33.227 casos confirmados do novo coronavírus no DF. Desses, 21.232 são considerados recuperados da doença.

Ceilândia lidera o ranking das região administrativa com maior número de casos (4.574) e mortes (92). Na sequência aparece: Plano Piloto, com 2.433 ocorrências e 22 óbitos; Taguatinga, com 2.376 registros e 33 vítimas; e Samambaia, onde 41 pessoas perderam a vida para o novo coronavírus e 2.130 foram infectadas. De acordo com a Secretaria de Saúde, dos casos ativos, 52 pacientes estão em estado grave; 153 apresentam forma moderada da infecção; e 168 são quadros leves. Outras 11.199 ocorrências estão em análise.

A taxa de ocupação das unidades de terapia intensiva (UTIs) na rede pública do DF é 65,89% — destes, 85,82% atendem a pacientes com permanência de até 15 dias; 9,57%, pacientes com permanência entre 16 e 30 dias; e 3,20% com permanência superior a 30 dias. São 283 pacientes internados em leitos de UTI. Ao todo, o Distrito Federal tem 428 leitos destinados ao tratamento da covid-19, restam 145 leitos disponíveis na capital. Ao contrário do que foi observado no início da pandemia, quando os homens eram maioria entre os infectados, no momento as mulheres correspondem a 50,4% dos casos registrados.

Com informações do Correio Braziliense

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